sábado, 1 de maio de 2010

Sobre livros e leitura...


As histórias e a formação de valores
Poderemos controlar uma boa alfabetização, garantir o aprendizado de geografia, falar
inglês, tocar piano. Mas como poderemos controlar a formação do caráter? A adoção de
valores? Uma conduta ética que leve à formação de um adulto construtivo em sua
comunidade?
A adoção de um conjunto de valores que norteie a vida de uma pessoa é algo
absolutamente íntimo, não se força e nem se obriga. Este processo encerra uma escolha,que deve ser livre e fruto do entendimento de que a decisão de adotar determinado valor é uma forma de conduta que lhe trará satisfação e poderá conduzi-lo a boas realizações.
Assim, para possibilitar esta escolha é necessário que lhe sejam apresentados alguns
exemplos de conduta, de modo de vida, de adoção de atitudes e valores que levem a
resultados satisfatórios para quem os está vivendo, a sua família, a seus amigos e à
sociedade em geral.
Em outras palavras
é preciso que lhes contem histórias...
As histórias ensinam a viver. Elas encerram anseios, desafios, vitórias, derrotas e
conquistas. O encadeamento do enredo exemplifica modos de vida e o final, geralmente
feliz, é um alento, uma esperança, uma diretriz que mostra que aquele que agir assim
também poderá obter a felicidade.
Assim, chegamos às conclusões:
Se as crianças estão mais abertas a mensagens alegres,
que falem sua linguagem simples...
e
...se as histórias são capazes de fornecer referências
para a formação do caráter da criança...
podemos concluir que as histórias são uma excelente forma de ensinar!

As crianças poderão recebê-lo através da leitura de um livro, mas isto está longe de ser um ato unilateral. O educador deverá motivá-la, criar expectativa sobre o seu conteúdo, acompanhar como a criança está absorvendo cada uma de suas páginas, dialogar com seus personagens, caminhar, e ensinar a criança a caminhar, no local onde a história está se desenrolando.
O educador poderá optar por contar a história às suas crianças; para isso, ele deve se assegurar que suas palavras e o uso dos recursos auxiliares poderão transmitir fielmente a
mensagem.
O panorama onde as histórias se desenrolam contém elementos importantes para a sua
compreensão; o narrador deverá descrevê-los com exatidão. Por exemplo, na história “A
semente e a verdade”1, é importante deixar claro que o principal objetivo do imperador era
encontrar alguém digno para poder sucedê-lo; também é importante realçar o empenho
que o menino teve em cuidar da semente, para que a criança possa entender a estratégia do rei e valorizar a lealdade do menino.
Deve-se também tomar cuidado com as circunstâncias que envolvem a história; pode
acontecer que o protagonista tenha ações nobres, mas seja pouco cortês ou arrogante.
Tudo estará sendo absorvido pela criança e nem sempre podemos controlar a intensidade
com que isto está sendo absorvido; assim, devemos estar atentos a todos os tipos de
mensagens que estamos transmitindo.

Aspectos do desenvolvimento que as histórias proporcionam
Na escolha e preparação da história, o educador deve estar ciente de que ela também
estará contribuindo com o desenvolvimento das crianças nos seguintes aspectos:
• Afetividade
• Raciocínio
• Senso crítico
• Imaginação
• Criatividade


A história contadaO contador de história deve ser encantador, ter graça, prender a atenção da platéia. E, ao contrário do que a maioria acha, ser um bom contador de história é muito mais técnica do que dom.

Uso da voz
A voz é a ferramenta maior do contador de história. Em primeiro lugar, ele
deve se assegurar de que todas as pessoas o estão entendendo. Sua voz deve ser
clara, com boa dicção, pronunciando as palavras devagar e corretamente cada
uma de suas sílabas, falando claramente cada encontro vocálico ou consonantal,
pronunciando os finais com as letras R, S e L.
A voz deve ser em bom volume; não pode ser baixa, a ponto de necessitar
esforço para escutá-la, e não deve ser muito alta, o que irrita e tira o momento de
cumplicidade que o narrador e os ouvintes devem ter.
A entonação, mais grave ou aguda, permite compor uma série de personagens.
As crianças adoram ouvir a voz estridente da bruxa e a voz “grossona” do urso.
A combinação dos elementos “velocidade” e “volume” também passam emoções:
uma voz ligeiramente mais alta e mais rápida, passa momentos de perigo; uma
voz, um pouco mais baixa do que a da narração normal e um pouco mais devagar,
passa um sentimento de segredo, suspense. Usar estes artifícios muito simples dá
colorido à narração.

Postura facial e corporal
A voz evidentemente não vem sozinha; ela vem acompanhada de
todo um corpo e ele precisa falar a mesma “linguagem”. O contador deve se
entregar por inteiro à narração: o corpo deve estar ereto, em uma posição na qual
todas as crianças possam vê-lo, e é errado fazer qualquer ato que não tenha
sentido com a narração que está fazendo (se coçar, jogar os cabelos, acenar para
quem está passando, etc.). Os gestos devem ser comedidos e utilizados apenas
quando a história permitir, sendo que nestes momentos podem até ser
exagerados: abrir os braços para mostrar que algo é bem-vindo, pôr as mãos na
cabeça em sinal de susto, “abraçar-se” para mostrar aconchego, etc.
A expressão facial também deve ser cuidada, e para isso deve-se treinar na frente
do espelho, pois o fato de estarmos “sentindo” uma emoção não assegura que a
estamos transmitindo.

Elementos da história
Compreender os elementos da história é importante para dar colorido à narração.

Personagens
É importante distinguir os personagens da história, saber quais são os
principais, os secundários e os supérfluos. Dos principais necessitamos conhecer
bem suas características, para poder transmiti-las aos ouvintes de forma que eles
possam imaginá-los e, com isso, compreender melhor a história. Dos secundários
não precisamos ter tanto conhecimento e os supérfluos geralmente são apenas
mencionados.
Cenário
É o local onde se desenrola a história. É interessante conhecer mais sobre ele,
indo além do que está escrito no livro. Isto nos levará a circunstâncias que
poderemos utilizar durante a narração ou para criar alguma atividade
complementar que reforce o conteúdo da história.
Desafio Central
As histórias geralmente têm o seu núcleo em um conflito principal, e o seu
desenrolar vai se ocupar de fazer com que o ouvinte entenda e se envolva com
este conflito, acompanhando-o atentamente e torcendo por um final feliz, que na
maioria das vezes acontece. Muitas vezes, além desse conflito central existem os
periféricos que tornam a história mais empolgante; quando isso acontece é
preciso ter cuidado para não dar muita ênfase a eles e deixar a narração confusa.

O ritmo de uma narração
Uma narração é uma sucessão de emoções: surpresa, dúvida, encantamento, medo,
ansiedade, alívio, revolta, admiração, alegria e tantas outras.
Para conseguir o envolvimento da platéia é necessário suscitar estes momentos de
emoções de uma forma planejada, onde eles estejam estrategicamente colocados e
alternados.
Uma boa narração precisa ter ritmo, e para empregá-lo é necessário entender as partes
que compõem uma história: introdução, enredo, ponto culminante e desfecho.

Dicas para contar uma história
1- Fazer a escolha cuidadosa da “sua” história.
2- Escolher aquela que bate com a sua forma de pensar, que lhe encanta e incita a sua imaginação.
3- Estudar a história entendendo os seus elementos principais: personagens, cenário,
conflito principal. Refletir sobre a sua mensagem educacional, destacando quais são as situações usadas para a sua transmissão. Dividi-la nas quatro partes: introdução,
enredo, ponto culminante e desfecho.
4- Decidir se na narração serão usados recursos auxiliares e, neste caso, uais.Fazer uma adaptação da história visando a adequação aos recursos auxiliares e à narração com as suas próprias palavras. Providenciar os recursos auxiliares, como fantoches, adereços, etc.
5- Contar a história para si mesmo, em voz alta, para detectar os pontos de maior
dificuldade e os que podem ser aproveitados para dar maior ênfase. Preferencialmente
fazer diante do espelho.
6- Minutos antes da narração, reler a história, ou a sua adaptação. Isto relembrará
elementos da história e permitirá “entrar” no clima.
7- A história deverá ser contada sempre após as crianças estarem ambientadas e terem
satisfeito suas principais expectativas com o ambiente e umas com as outras.
Preferencialmente após uma atividade agitada.
8- Sentar as crianças em círculo com o narrador fazendo parte dele.
9- Iniciar comentando alguns de seus aspectos principais, para que as crianças coloquem suas experiências sobre eles, minimizando as possibilidades de interrupções durante a história.
10- Entregar-se à história, de forma confiante e calma, valorizando todos os esforços
empregados para a sua escolha e estudo.
11- Não permitir interrupções; caso alguma criança queira interromper, fazer um sinal com a mão mostrando que depois da narração a criança será atendida.
12- Após a narração, o diálogo poderá ser incentivado, nunca, porém, concluído pelas
crianças. Atender àqueles que quiseram se manifestar.

Adaptando jogos
Os jogos comuns permitem adaptações para que as crianças vivenciem a história.
• Em um jogo de pegar o pegador pode ser o dragão.
• A organização pregada no livro “Ordem é progresso” pode ser vivenciada em
um revezamento.
• Em um jogo de bola, onde esta pode ser as diversas espécies de lixo e os seus
arremessos só valerão pontos quando caírem no cesto certo.
• A estratégia de um jogo pode estar montada em zonas que representam águas
paradas que precisam ser eliminadas para evitar a proliferação da dengue.
• Um jogo de mímica pode ter como desafio representar tipos de trabalho voluntário.
• Em um jogo de perguntas e respostas o desafio pode ser a seqüência e a
interpretação das frases do Hino Nacional.

Artesanato
• Apresentar em forma de “história em quadrinhos”.
• Reproduzir cenas da história em argila.
• Fazer um quadro para ser o cenário do teatro de fantoches.
• Fazer a maquete de uma cidade para que o prof. "X" ensine as regras de trânsito.
• Fazer um castelo/floresta em jornal, papelão, madeira, tecido e argila etc.
• Fazer os bonecos em papier mâché, desenhar um figurino para outros personagens.
• Outras manifestações artísticas e lúdicas.

O enredo e as mensagens educacionais de uma história também podem ser usados como tema para reflexão em diversas dinâmicas de grupo.

Bibliografia
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UNIVERSIDADE Espiritual Mundial Brahma Kumaris. Vivendo valores - um manual. São Paulo:UEMBK, 1995.

Autora: Vania Dohme (vania@dohme.com.br + www.editorainformal.com.br)
http://www.educardpaschoal.org.br/web/upload/NossosLivros/63_livro_alemdoencantamento.pdf

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